Dramaturgo Chico de Assis - Mestre Chico de Assis

12:27 Kagyn 0 Comments

Eu tinha 14 anos, era ator em um grupo de teatro amador, quando soube do dramaturgo Chico de Assis. Suas peças teatrais, em especial seu Teatro de Cordel ("O testamento do cangaceiro"; "As aventuras de Ripió Lacraia"; e "Galileu da Galiléia") são muito encenadas por grupos amadores Brasil afora, e eu acabara de conhece-las através dos livros "Teatro da Juventude" quando fiquei sabendo do Projeto Ação Dramática. Tal projeto visava iniciar a formação de profissionais para o teatro, então tinha curso de cenografia, iluminação, direção, atuação e dramaturgia. Nunca saberei dizer ao certo a razão, mas escolhi o curso de dramaturgia, escolhi ser aluno de Chico de Assis. No primeiro ano eu mal abri a boca, pois tamanho conhecimento, e a forma como Chico sempre o expressou, me intimidavam. No segundo ano, já o conhecendo melhor, eu já formulavas algumas frases (e as falava em voz alta). No final do ano foi solicitado que todos os alunos deveriam escrever uma peça, seria a formatura dos jovens dramaturgos do projeto (eu sendo o mais jovem, então com 15 anos). Escrevi a "A canção de Gabud Aiar" e entreguei para sua leitura dramática frente a todos os demais alunos. Aquele foi o dia de maior apreensão de minha jovem vida, não sei de onde tirei coragem para entregar aquelas folhas datilografadas (sim, datilografadas) e repletas de erros gramaticais para a avaliação do Mestre Chico de Assis. Foi feita a leitura, ao final os protocolares aplausos e depois a avaliação de Chico de Assis. Ele fez as devidas observações sobre os erros, mas ao fim elogiou (os dois anos de aulas semanais não foram em vão). Eu já estava aliviado, mas ao saber que minha peça tinha sido uma das escolhidas para leitura dramática em público, o que ocorreria na Sociedade Lítero-Dramática Gastão Tojeiro em leitura que seria dirigida pelo próprio Chico de Assis (se não me engano, a única que ele próprio dirigiu), fiquei convicto de qual seria o meu papel no teatro: assim como Chico de Assis, eu seria um dramaturgo.

Após o fim do Projeto Ação Dramática fui ao SEMDA (Seminário  de Dramaturgia do Arena), onde minha formação como dramaturgo teve mais três anos dos valorosos e perspicazes (as vezes deliciosamente cruéis) ensinamentos do Mestre Chico de Assis. Entre estes ensinamentos estava a diferença entre um professor e um mestre: o professor professa seu conhecimento, é uma relação unidirecional onde o conhecimento está posto, é estático; o mestre ensina e aprende com cada um de seus discípulos,  o conhecimento não é uma coisa estática.

Aprendi a escrever, a dirigir, a desistir de atuar, a aprender e ensinar, a compartilhar, tudo com um só homem.

Chico de Assis é meu mestre. Continuará a ser, pois os mestres não morrem, eles passam a viver dentro de seus discípulos (em adaptação a uma frase dita por ele), e tenho certeza que Chico de Assis deixa centenas de discípulos. E cada um de nós, a partir do momento em que nos negamos a viver somente no planeta terra, expandindo a nossa cidadania para a galáxia, passamos a ser uma galáxia onde vive o cidadão Chico de Assis. 

Uma pessoa só morre quando suas ideias e obras morrem. O Mestre Chico de Assis vive, e viverá por muitos e muitos anos, talvez até a encenação em um teatro de outro planeta, porque deixa sua obra registrada no papel e suas ideias registradas nas pessoas (seus discípulos, seus espectadores).


Chico de Assis  *1931 † 2015 - Foto tirada em 09/2014 no lançamento do Vol.1 e Vol.2 de "O Teatro Seleto de Chico de Assis"

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